sábado, 16 de agosto de 2025

Quando a Reciprocidade Comercial Vira um Jogo Ideológico: O Brasil na Mira da Seção 301

Em um mundo cada vez mais polarizado, as relações comerciais internacionais deixaram de ser exclusivamente uma questão de competitividade e passaram a refletir, também, os alinhamentos ideológicos dos governos. O Brasil, sob a gestão atual, parece trilhar esse caminho tortuoso, promovendo uma política comercial seletiva, enviesada e arriscada. Isso o coloca, cada vez mais, sob o radar de instrumentos como a Seção 301 da legislação americana, uma poderosa ferramenta de defesa dos interesses econômicos dos Estados Unidos contra práticas consideradas injustas, discriminatórias ou desleais por parte de seus parceiros comerciais.

A Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 permite que o governo dos EUA investigue e imponha sanções contra países que distorcem a concorrência, violam a propriedade intelectual, impõem barreiras desiguais ou deixam de oferecer tratamento equitativo às empresas americanas. Historicamente usada com cautela, ela ganhou novo protagonismo nos últimos anos, sobretudo durante a guerra comercial com a China. E agora, pelo comportamento recente da política externa brasileira, não seria impensável que o país voltasse a figurar como alvo de atenção do USTR (Representante de Comércio dos EUA).

E engana-se quem pensa que a Seção 301 se resume à elevação de tarifas. Seu potencial destrutivo vai muito além, e seus efeitos podem atingir diversas camadas da economia e da diplomacia brasileira:

 

·         Perda de credibilidade internacional: Ser alvo da Seção 301 é ser rotulado como parceiro comercial desleal. Isso afeta a confiança de investidores, reduz o fluxo de capital estrangeiro e compromete o acesso a financiamentos internacionais.

·         Retaliações em cadeia: Uma ação americana pode gerar um efeito dominó. Outros países podem seguir o exemplo, ampliando o isolamento do Brasil no comércio global.

·         Fuga de empresas e realocação de cadeias produtivas: Multinacionais com operações no Brasil, especialmente as com sede nos EUA, podem reduzir investimentos, mudar centros de produção ou redirecionar rotas logísticas para mercados mais estáveis e previsíveis.

·         Impacto direto na economia real: Setores exportadores sensíveis, como carne bovina, etanol, aço, celulose e máquinas, podem sofrer prejuízos severos, com desemprego e perdas fiscais em cascata.

·         Fragilidade diplomática: O Brasil enfraquece sua posição em organismos como a OMC, compromete negociações bilaterais e atrasa sua eventual entrada em blocos econômicos estratégicos como a OCDE.

·         Mancha institucional: O mais grave talvez seja o dano à imagem do Estado brasileiro como um todo. Práticas comerciais motivadas por ideologia, e não por interesse nacional, deixam um legado de desconfiança que poderá perdurar mesmo após uma eventual mudança de governo.

O que está em jogo aqui não é apenas uma discrepância tarifária entre Brasil e Estados Unidos, onde produtos brasileiros entram no mercado americano com taxas mínimas, enquanto os produtos americanos enfrentam um ambiente hostil no Brasil. Trata-se de um desequilíbrio sistêmico alimentado por um viés ideológico, que premia países "amigos do governo" com benefícios comerciais (como China, Rússia e Venezuela), ao mesmo tempo em que impõe obstáculos a nações democráticas e economicamente estratégicas como os EUA.

Essa assimetria se manifesta de várias formas: desde tarifas elevadas a bens americanos, até exigências regulatórias seletivas, licenças dificultadas, subsídios internos que favorecem parceiros ideológicos e incentivos que distorcem o ambiente de concorrência. Trata-se de uma política externa orientada não pela lógica da reciprocidade e da eficiência, mas por afinidades ideológicas que não raro se chocam com os interesses nacionais de longo prazo.

Essa postura não apenas desrespeita os princípios básicos do comércio justo, como também compromete o acesso do Brasil a mercados cruciais, desestimula investimentos estrangeiros e fragiliza sua posição nas cadeias globais. Em vez de buscar acordos equilibrados com base na transparência, previsibilidade e cooperação técnica, o país se comporta como um jogador ideológico em um tabuleiro econômico, um erro que poderá ter consequências severas.

O uso da Seção 301, nesse cenário, não seria um ato isolado de proteção americana, mas uma resposta legítima a práticas que violam o espírito da boa-fé comercial. Seria, na prática, um recado claro: quem deseja vender ao mundo livre precisa agir com regras de mercado e não com filtros ideológicos.

O Brasil precisa decidir se quer ser um parceiro confiável no cenário internacional ou se continuará usando o comércio exterior como instrumento político. Porque a conta, como sempre, chega. E, neste caso, pode vir em forma de tarifas pesadas, desinvestimento, isolamento e perda irreversível de competitividade.

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